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Mostrando postagens com o rótulo PSICANÁLISE

Culpa e Vergonha - Estudos Sobre o Superego

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Culpa e vergonha são feridas silenciosas da alma, moldadas pela mão invisível do Superego - essa instância psíquica que vigia , censura , corrige e pune . São afetos primordiais, enraizados no processo de civilização e internalização das normas sociais, cujas raízes se entrelaçam com o desejo de pertencimento e com o medo da exclusão. Na tradição psicanalítica, são dois modos distintos, porém complementares, de o sujeito ser afetado por suas faltas reais ou imaginárias . A etimologia nos ilumina. A palavra “culpa” vem do latim culpa , que significa “falta”, “erro”, “falha”. Já “vergonha” deriva do latim verecundia , que está ligada a “temor respeitoso”, pudor ou recato. Ambas emergem da tensão entre o desejo e a interdição, entre o princípio do prazer e o da realidade. Mas enquanto a culpa exige expiação diante de uma autoridade interiorizada, a vergonha prefere o silêncio e o ocultamento - ela não quer perdão, quer desaparecer dos olhos do outro. Freud, em O Eu e o Isso (1923)...

Gratidão

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Gratidão: quando o coração aprende a lembrar Há um gesto invisível que salva o ser humano do desamparo: a gratidão. Não aquela aprendida por convenção social, que agradece com os lábios, mas a gratidão que pulsa do íntimo, quando o ser reconhece que algo bom lhe foi dado sem exigência de retorno. É memória viva do bem recebido. É o corpo dizendo sim à vida, apesar de tudo. Etimologia: um nome antigo para um sentimento essencial A palavra "gratidão" deriva do latim gratia , que significa graça, favor, benevolência. Está ligada ao termo gratus , que quer dizer agradável, bem-vindo, digno de reconhecimento. A raiz é a mesma que forma graça  - aquilo que excede, que vem além do merecimento. Gratidão, assim, carrega em sua essência o sabor do imerecido. Não se trata de dívida, mas de reconhecimento. O cérebro que agradece: o que a ciência nos revela A neurociência vem confirmando o que a experiência humana já sabia em silêncio: ser grato faz bem. Estudos com neuroimagem mostr...

Deslocamento e Condensação

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Deslocamento e Condensação - Típicos do Trabalho do Sonho e as Noções Linguísticas de Metonímia e Metáfora. No palco noturno da alma, onde o inconsciente escreve sem censura, o sonho trabalha como um poeta enigmático. Freud nomeou dois de seus artífices principais: deslocamento e condensação  - engrenagens do processo primário, mecanismos do Trieb , onde o desejo se disfarça para atravessar o muro da censura psíquica. Condensação , do latim condensare (“tornar denso, espesso”), é a fusão de múltiplas ideias, imagens ou lembranças em um só elemento onírico. É como se o sonho fosse uma tapeçaria onde fios diversos se entrelaçam num único nó simbólico. Um rosto sonhado pode conter os traços da mãe, do amor perdido e de um medo antigo - tudo ao mesmo tempo. Lacan viu nisso o parentesco com a metáfora , onde um significante substitui outro, criando sentido por superposição. Deslocamento , do latim dislocare (“tirar do lugar”), é o truque do inconsciente para desviar o foco do desej...

Bhagavad‑Gītā - Filosofia e Psicanálise

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A Bhagavad‑Gītā (ou “Canção do Senhor”) é um diálogo filosófico de imenso valor para a mente humana, situado no épico Mahābhārata . O texto desfila 700 versos distribuídos em 18 capítulos, onde Krishna , avatar de Vishnu, guia Arjuna , o guerreiro paralisado pela crise moral, às vésperas da batalha de Kurukshetra ( britannica.com ). Importância filosófica A Gītā harmoniza três grandes correntes filosóficas da Índia antiga: o sāṅkhya (dualismo matéria / espírito), o karma‑yoga (ação desprendida) e o bhakti (devoção) . Ela responde a perguntas eternas: “Quem sou eu? Qual meu dever? Como agir sem se perder?”. A sentença de Arjuna - “antes da guerra, prefiro a paz da morte” - abre espaço à filosofia como prática existencial . Origem, etimologia e período Bhagavad : do sânscrito bhagavat : “o Senhor, possuidor de glória”. Gītā : “canção”, de gī , “cantar” ( pt.wikipedia.org , pepsic.bvsalud.org ). O título significa “Canção do Senhor” - o canto divino que orienta o Ser. Foi...

Yoga Sūtra de Patañjali

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Yoga Sūtra de Patañjali: a psicologia da libertação O Yoga Sūtra de Patañjali é considerado a obra clássica fundamental do Yoga enquanto sistema filosófico. Composto provavelmente entre os séculos II a.C. e IV d.C. , o texto reúne 196 aforismos ( sūtras ) que descrevem o caminho da mente para o silêncio interior, rumo ao kaivalya  - a libertação absoluta da consciência. O nome Patañjali deriva do sânscrito: "pat" (पत्) significa “cair” ou “descer”, e "añjali" (अञ्जलि) é o gesto de mãos em prece. Segundo a tradição, ele “desceu como oferenda divina”. Há controvérsias sobre sua historicidade, mas é comum associá-lo a três obras: uma gramática ( Mahābhāṣya ), um tratado de medicina ayurvédica e os Yoga Sūtras . É possível que "Patañjali" seja um nome simbólico, representando uma linhagem de saber. A importância de sua obra para o Yoga é imensurável. Ele sistematiza o que era uma prática ancestral em oito passos ( aṣṭāṅga yoga ): Yama (condutas éti...

Homem de bons costumes

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🧭 “Um homem que cultiva bons costumes está em paz com o seu superego e em diálogo com sua própria alma.” 🌿 Na visão psicanalítica, os bons costumes não são apenas normas sociais - são construções simbólicas que ajudam o sujeito a lidar com os impulsos do id (Inconsciente) e com as exigências da realidade. Quando o homem age com ética, ele não reprime: ele sublima -  transforma o desejo bruto em gesto nobre. 🎭 Na filosofia, os bons costumes são o alicerce da virtude. Aristóteles dizia que a excelência é hábito. E na alma humana, o hábito do bem molda não só a conduta, mas também o caráter. Um homem de bons costumes é, portanto, alguém que transita com mais leveza entre o desejo e o dever, entre o instinto e a civilização. 🌟 Ser correto não é ser perfeito - é ser coerente com aquilo que se quer ser. 💫 #Ética #Psicanálise #BonsCostumes #Filosofia #Autodomínio #Virtude #Freud #Aristóteles 📚 Referências: FREUD, Sigmund. O mal-estar na civilização , 1930. ARISTÓTELES. Ética ...

Melanie Klein

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🌿 Melanie Klein: um percurso de sofrimento, invenção e psicanálise profunda 🌿 Melanie Reizes Klein nasceu em 30 de março de 1882 , em Viena, Bauerngasse, como a caçula de quatro filhos do médico Moritz (Moriz) Reizes e da enigmática Libussa Deutsch. Sua irmã mais velha Sidonie faleceu com apenas oito anos de tuberculose aos quatro de Melanie, e o irmão Emmanuel morreu aos 20 de tuberculose e complicações medicinais — perdas que marcaram os alicerces emocionais da futura analista ( melanie-klein-trust.org.uk , minnickskleinacademy.com ). Cresceu num ambiente familiar culto, mas permeado por ausências e tensões: a mãe exercia autoridade, o pai oferecia estímulo intelectual . Na adolescência, Klein foi aluna aplicada e sonhava estudar medicina – resultado do exemplo paterno –, chegando a ingressar no Gymnasium aos 16 anos . Porém, aos 21, em 1903 , casou-se com Arthur Klein: um engenheiro químico tio de seus irmãos, e sacrificar sua carreira médica foi uma escolha imposta pelas norm...

Diferenças entre os sentimentos de: Pena, Dó, Compaixão e a Dor do Outro

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No universo dos afetos, convivem sentimentos semelhantes, mas distintos: pena , dó , compaixão e a dor do outro — cada um com raízes psicológicas específicas. Pena e dó se aproximam. A pena muitas vezes nasce de uma posição superior: “que pena dessa pessoa” — um afeto que pode revelar distância e julgamento passivo.  Já a dó traz uma abertura mais humana, reconhecendo a vulnerabilidade: “sinto dó do sofrimento alheio” — ainda centrado na emoção do sujeito, mas com menos escalonamento hierárquico. 🕊️ Compaixão , por outro lado, é entrar no lugar do outro, sentir junto. No grego, “pathos” (sofrimento) com o prefixo “com-” (junto). Nesse gesto se ativa a capacidade empática — com o outro situado no mesmo nível interno. É uma ponte emocional, que pode motivar cuidado real e ação compassiva. 🤝 A dor do outro é o que se apresenta como perceptível: é a cena emocional contextualizada, que pode despertar pena, dó ou compaixão, conforme as defesas do indivíduo. Na ótica da psi...

12 passos dos Alcoólicos Anônimos

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Os 12 Passos e o Inconsciente que Clama por Liberdade 🍃🌀🍷 Sempre que mergulho na história dos 12 passos dos Alcoólicos Anônimos , sinto que estou diante de algo que transcende uma simples técnica de recuperação. É um verdadeiro caminho de retorno para si mesmo. 🌌 Tudo começou nos anos 1930, quando dois homens — Bill Wilson , um corretor da bolsa de Nova York, e o Dr. Bob Smith , médico de Ohio — se encontraram em meio à dor comum do alcoolismo. Ambos haviam fracassado em inúmeros tratamentos. Mas ao se encontrarem, algo diferente aconteceu: a identificação. Eles perceberam que, ao compartilhar suas experiências e dores, sentiam alívio e fortalecimento. Foi dessa troca que nasceu o embrião do que mais tarde se tornaria o Alcoólicos Anônimos . 🤝 A estrutura dos 12 passos surgiu da união de diversas influências: práticas espirituais cristãs, os princípios morais do Grupo Oxford (um movimento evangélico da época), o pensamento sobre reparação de danos, e até ideias próximas à c...

Sonhos, Chistes, Atos Falhos e Sintomas na Psicanálise

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💭 Sonhos, Chistes, Atos Falhos e Sintomas na Psicanálise Na visão psicanalítica, sonhos, chistes (piadas), atos falhos e sintomas não são acasos da mente, mas formas simbólicas de expressão do inconsciente. Freud os chamou de "formações do compromisso" , ou seja, manifestações em que desejos inconscientes encontram uma brecha para emergir — ainda que de modo disfarçado. 🔍 🌙 Sonhos Para Freud, o sonho é a "via régia para o inconsciente" . Nele, desejos reprimidos se realizam simbolicamente. Por exemplo, sonhar com um elevador desgovernado pode representar um desejo sexual reprimido , ou o medo de perder o controle. 📚 Etimologia: "Sonho" vem do latim somnium , que significa “visão durante o sono”. 😂 Chistes Chistes são piadas, trocadilhos ou ditos espirituosos que, segundo Freud em O Chiste e sua Relação com o Inconsciente , servem como escape do recalque . Ao rir, liberamos tensões internas. Um exemplo: a piada sobre um médico que se esquece de...

A Alegoria da Caverna de Platão: Entre Sombras, Luz e Liberdade

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🔥🕳️ A Alegoria da Caverna de Platão: Entre Sombras, Luz e Liberdade No Livro VII da República , Platão apresenta uma das mais poderosas metáforas da história da filosofia: a Alegoria da Caverna . Trata-se de uma narrativa simbólica sobre o processo de despertar da consciência , o confronto com a verdade e a dolorosa ruptura com a ignorância. 🏛️ A Cena na Caverna Platão descreve prisioneiros acorrentados desde o nascimento dentro de uma caverna. Eles só conseguem ver a parede à sua frente, onde sombras de objetos projetadas por uma fogueira ao fundo constituem toda a sua realidade. Para esses homens, o mundo se resume àquilo que sempre viram: sombras . Até que um deles se liberta, sobe para fora da caverna e, após a dor ofuscante da luz do sol, descobre o verdadeiro mundo: a realidade iluminada pelo conhecimento e pela razão . ☀️ 🧠 Etimologia & Simbologia Alegoria : do grego allegoria , que significa "dizer o outro" ou "falar de outra maneira". Trata-...

Mecanismo de Defesa: A Concepção do Eu de Sócrates à Freud

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🧠 Mecanismo de Defesa: A Concepção do Eu de Sócrates à Freud A busca pelo autoconhecimento atravessa milênios, e tanto Sócrates quanto Freud dedicaram-se, cada um a seu modo, a entender o que chamamos de “Eu”. Ambos, ainda que separados por séculos, partilharam da ideia de que há uma parte desconhecida dentro de nós. Para Sócrates, era preciso “conhecer a si mesmo” para alcançar a virtude. Para Freud, era necessário “tornar consciente o inconsciente” para lidar com o sofrimento psíquico. 📜 Etimologia e Conceito de "Eu" A palavra "Eu" vem do latim ego , que significa "eu mesmo". Na Grécia antiga, o termo próximo seria psyche (ψυχή), alma. Sócrates falava do Eu como a essência racional do ser humano. Já Freud, no século XX, o dividiu em três instâncias: Id (isso), Ego (eu) e Superego (super-eu) , construindo o famoso aparelho psíquico. 🧱 O que são os Mecanismos de Defesa? Para Freud, o Ego é responsável por mediar os impulsos do Id (desejos i...

O Sujeito Simbólico e o Significante na Psicanálise

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🧠 O Sujeito Simbólico e o Significante na Psicanálise Na visão psicanalítica, especialmente na obra de Jacques Lacan, o sujeito simbólico é aquele que se constitui na linguagem . Ele não é um “eu” consciente, coeso e dono de si, mas sim um sujeito dividido, estruturado pelo inconsciente , que é, segundo Lacan, “estruturado como uma linguagem”. 📌 Etimologia : Sujeito vem do latim subiectus , que significa “colocado sob”. Simbólico deriva do grego symbolon , que era um objeto dividido em dois, cujas partes serviam para reconhecimento. Significante tem origem no latim significare , “dar sentido, marcar com um sinal”. 🧩 O que é o sujeito simbólico? O sujeito simbólico não é o mesmo que o sujeito da razão ou da consciência. Ele emerge como efeito do significante — ou seja, das palavras, dos nomes, das identificações que vêm do Outro (família, cultura, linguagem). Esse sujeito só existe porque é falado , nomeado , inscrito na linguagem desde antes de nascer. 👶 Exemplo:...