Freud - Sobre o Livro "Moisés e o Monoteísmo".
"Moisés e o Monoteísmo" de Freud: A Psicologia da Religião e a Crítica ao Judaísmo ✡️📚
O livro "Moisés e o Monoteísmo", escrito por Sigmund Freud entre 1934 e 1938 e publicado em 1939, é uma das obras mais polêmicas e controversas do autor. Nesse trabalho, Freud se aventura a reinterpretar a história religiosa e cultural do povo judeu, buscando analisar a figura de Moisés à luz da psicanálise e do desenvolvimento da religião monoteísta.
Freud parte de uma hipótese ousada e provocadora: ele sugere que Moisés, em sua essência, não teria sido judeu, mas egípcio. De acordo com a teoria freudiana, Moisés teria sido um sacerdote egípcio que adotou o monoteísmo, que, na visão de Freud, teve raízes no culto de Aton, o deus solar de Akhenaton, um faraó egípcio. Freud acredita que, ao ser expulso do Egito, Moisés teria levado consigo essa crença e imposto a ideia de um Deus único ao povo hebreu, criando o que conhecemos como monoteísmo judaico.
A Relação com o Complexo de Édipo
Como em muitas de suas obras, Freud utiliza o complexo de Édipo como uma chave para compreender os aspectos psicológicos profundos das figuras históricas e religiosas. Em Moisés e o Monoteísmo, Freud vê o monoteísmo como uma forma de repressão ao desejo edipiano, ou seja, o desejo do filho de matar o pai para estabelecer uma relação direta com a mãe. Na psicanálise de Freud, o monoteísmo é uma forma de projetar a figura de Deus como um pai absoluto, distante e impositivo, em contraste com a multiplicidade de deuses mais humanos de outras religiões.
Freud também sugere que o assassinato simbólico de Moisés pelo povo judeu seria uma metáfora para o processo de repressão e distanciamento de um modelo paternal autoritário, em um processo coletivo de lembrança e esquecimento. Isso reflete a maneira como as sociedades lidam com figuras fundadoras e os processos históricos que formam sua identidade.
Crítica ao Judaísmo e ao Cristianismo
Embora Freud fosse judeu, suas observações sobre o judaísmo em Moisés e o Monoteísmo são, em muitos aspectos, críticas e desafiadoras. Ele vê o judaísmo como uma religião que, por sua natureza, reflete uma luta interna com a identidade e a autoridade paternal. Freud não exalta Moisés como um herói religioso, mas o vê como uma figura complexa, cujas ações geraram um conflito psicológico coletivo.
Em relação ao cristianismo, Freud também tem suas críticas. Ele aponta a figura de Cristo como uma continuação da repressão ao pai (Deus) e interpreta a morte de Cristo como uma forma de "submissão" a essa autoridade paterna. O cristianismo, para Freud, representa uma tentativa de suavizar a figura do Deus autoritário, mas, ao mesmo tempo, reforça a ideia de uma relação de filho com o pai.
Contribuições e Críticas de Grandes Pesquisadores
O livro gerou várias reações ao longo das décadas. Psicólogos e estudiosos da religião têm visões divergentes sobre as propostas de Freud. Entre os defensores de Freud, encontramos o psicólogo Carl Jung, que, embora com algumas reservas, reconheceu a importância das ideias freudianas na compreensão da religião e da cultura. Jung, no entanto, não concordava com a visão materialista e histórica de Freud, acreditando que os mitos e as figuras religiosas possuíam dimensões arquetípicas universais.
Por outro lado, estudiosos da religião como Gershom Scholem, grande especialista em misticismo judeu, criticaram Freud por sua abordagem reducionista da história religiosa. Scholem questionou a ideia de Freud de que Moisés não fosse judeu e argumentou que essa teoria não leva em consideração as complexas raízes espirituais e culturais do judaísmo. Para Scholem, a busca de Freud por uma explicação psicanalítica da religião poderia obscurecer o verdadeiro significado da tradição judaica.
Outro crítico importante foi o historiador de religião, Eric Fromm, que, embora tenha compartilhado algumas das críticas freudianas ao autoritarismo da religião, sugeriu que Freud não reconhecia adequadamente o poder da religião em fornecer um sentido profundo para a vida humana, além da simples repressão de impulsos.
O Impacto de "Moisés e o Monoteísmo"
Embora Moisés e o Monoteísmo tenha sido criticado por muitos, também representa uma tentativa inovadora de compreender a origem da religião monoteísta e suas implicações psicológicas. O livro desafiou a visão tradicional da religião como algo transcendente e divino, colocando-a em uma perspectiva psicanalítica e histórica.
Freud, com sua teoria do "assassinato de Moisés", também trouxe à tona uma reflexão sobre como as sociedades podem reprimir aspectos de sua história e identidade. A crítica ao judaísmo e ao cristianismo, ao mesmo tempo, gerou debates intensos sobre a relação entre psicanálise e religião, algo que ainda permanece relevante nos dias de hoje.
Este livro representa não apenas uma análise histórica, mas também uma profunda reflexão sobre os aspectos psicológicos que moldam as grandes narrativas religiosas da humanidade. Freud, ao tratar de temas como fé, autoridade e identidade, segue sendo uma figura central no debate entre psicologia e religião. 🙏🧠
Referências Bibliográficas
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FREUD, Sigmund. Moisés e o Monoteísmo. Tradução de Sérgio P. de Almeida. Rio de Janeiro: Imago, 2006.
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JUNG, Carl G. A Psicologia e a Religião: A natureza da experiência religiosa. Tradução de Raquel Pires. São Paulo: Cultrix, 1981.
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SCHOLEM, Gershom. O Messianismo Judaico e sua História. Tradução de Samuel B. P. S. Ribeiro. São Paulo: Editora Perspectiva, 2002.
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FROMM, Erich. A Arte de Amar. Tradução de Paulo S. Martins. São Paulo: Editora Record, 2007.
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