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Culpa e Vergonha - Estudos Sobre o Superego

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Culpa e vergonha são feridas silenciosas da alma, moldadas pela mão invisível do Superego - essa instância psíquica que vigia , censura , corrige e pune . São afetos primordiais, enraizados no processo de civilização e internalização das normas sociais, cujas raízes se entrelaçam com o desejo de pertencimento e com o medo da exclusão. Na tradição psicanalítica, são dois modos distintos, porém complementares, de o sujeito ser afetado por suas faltas reais ou imaginárias . A etimologia nos ilumina. A palavra “culpa” vem do latim culpa , que significa “falta”, “erro”, “falha”. Já “vergonha” deriva do latim verecundia , que está ligada a “temor respeitoso”, pudor ou recato. Ambas emergem da tensão entre o desejo e a interdição, entre o princípio do prazer e o da realidade. Mas enquanto a culpa exige expiação diante de uma autoridade interiorizada, a vergonha prefere o silêncio e o ocultamento - ela não quer perdão, quer desaparecer dos olhos do outro. Freud, em O Eu e o Isso (1923)...

Transferência

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TRANSFERÊNCIA NA PSICANÁLISE: UM CONCEITO FUNDAMENTAL Etimologia: Transferência : do latim  transferre , composto de  trans-  (além, para o outro lado) e  ferre  (levar, carregar). Literalmente, “carregar para outro lugar”. A transferência é um dos pilares da teoria e da clínica psicanalítica. Trata-se de um fenômeno central, descrito inicialmente por Sigmund Freud em 1895, mas sistematizado em sua complexidade a partir de 1905, sobretudo no caso clínico de Dora ("Fragmento da análise de um caso de histeria"). É através da transferência que o passado irrompe no presente da análise. O paciente desloca para a figura do analista os afetos, fantasias, desejos, medos e expectativas que foram originalmente dirigidos a figuras significativas de sua infância - sobretudo os pais. O termo “transferência” vem do latim trans-ferre , que significa literalmente “levar através”, “transportar”. No campo psicanalítico, significa transportar sentimentos de uma relação passada pa...

Auto Busca

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Não basta querer. O querer, por si só, é faísca sem lenha, é impulso sem direção. Desejar é humano, mas desejar sem ação é o mesmo que sonhar com os olhos cerrados e permanecer deitado à margem da própria existência. O querer é o início, sim, mas é apenas o primeiro passo no abismo entre o ser e o vir a ser. Dedicar-se - eis o verbo que lapida o bruto da vontade. É no labor silencioso, repetido, solitário, que a alma se afina com o tempo. Dedicar-se é aceitar o sacrifício do conforto em nome de uma construção interna que ninguém aplaude, mas que tudo transforma. A psicanálise nos ensina que somos atravessados por forças que muitas vezes desconhecemos - pulsões, traumas, repetições. Mas também nos revela que é possível escavar essas camadas com coragem e paciência, como quem escuta o eco de um martelo em pedra bruta. Autoaperfeiçoar-se é um chamado ético. Não se trata de tornar-se perfeito - isso é ideal neurótico. Trata-se de tornar-se mais consciente, mais inteiro, mais honesto dian...

Gratidão

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Gratidão: quando o coração aprende a lembrar Há um gesto invisível que salva o ser humano do desamparo: a gratidão. Não aquela aprendida por convenção social, que agradece com os lábios, mas a gratidão que pulsa do íntimo, quando o ser reconhece que algo bom lhe foi dado sem exigência de retorno. É memória viva do bem recebido. É o corpo dizendo sim à vida, apesar de tudo. Etimologia: um nome antigo para um sentimento essencial A palavra "gratidão" deriva do latim gratia , que significa graça, favor, benevolência. Está ligada ao termo gratus , que quer dizer agradável, bem-vindo, digno de reconhecimento. A raiz é a mesma que forma graça  - aquilo que excede, que vem além do merecimento. Gratidão, assim, carrega em sua essência o sabor do imerecido. Não se trata de dívida, mas de reconhecimento. O cérebro que agradece: o que a ciência nos revela A neurociência vem confirmando o que a experiência humana já sabia em silêncio: ser grato faz bem. Estudos com neuroimagem mostr...

Ansiedade - Conceito básico

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O que é ansiedade, suas raízes e sintomas Ansiedade é aquele desconforto difuso, persistente, que não sabe dizer exatamente “por quê” - diferente do medo, que é sempre ligado a algo específico . Fisicamente, ela se manifesta como coração acelerado, tremor, sudorese, falta de ar, tensão corporal, irritabilidade, insônia, cansaço constante e dificuldade de concentração - sintomas bem reais que mexem com a vida cotidiana ( en.wikipedia.org ). A etimologia vem do grego “ánxios” , que significava “angustiado, oprimido”, termo que inspirou os primeiros usos médicos no século 19. A palavra “pânico” vem de Pan , o deus grego que assustava viajantes nos bosques . Quando começa e por que A ansiedade costuma aparecer na adolescência ou início da vida adulta - entre 15 e 35 anos , segundo estudos clínicos . As causas são múltiplas: 🧬 Genética : estudos com gêmeos sugerem 25–40 % de hereditariedade ( en.wikipedia.org ) 🧠 Neuroquímica : desbalanços de GABA, serotonina, norepinefrina, c...

Deslocamento e Condensação

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Deslocamento e Condensação - Típicos do Trabalho do Sonho e as Noções Linguísticas de Metonímia e Metáfora. No palco noturno da alma, onde o inconsciente escreve sem censura, o sonho trabalha como um poeta enigmático. Freud nomeou dois de seus artífices principais: deslocamento e condensação  - engrenagens do processo primário, mecanismos do Trieb , onde o desejo se disfarça para atravessar o muro da censura psíquica. Condensação , do latim condensare (“tornar denso, espesso”), é a fusão de múltiplas ideias, imagens ou lembranças em um só elemento onírico. É como se o sonho fosse uma tapeçaria onde fios diversos se entrelaçam num único nó simbólico. Um rosto sonhado pode conter os traços da mãe, do amor perdido e de um medo antigo - tudo ao mesmo tempo. Lacan viu nisso o parentesco com a metáfora , onde um significante substitui outro, criando sentido por superposição. Deslocamento , do latim dislocare (“tirar do lugar”), é o truque do inconsciente para desviar o foco do desej...

Solstício de Inverno

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O solstício de inverno — do latim solstitium , “sol parado” — é o instante em que o Sol se detém, imóvel no céu, como se respirasse fundo antes de retornar. É a noite mais longa, o auge da escuridão. Mas é também o berço da luz. Nele, o tempo se curva, o cosmos sussurra à alma: “espera, pois renascerás.” No Hemisfério Sul, o solstício de inverno, que marca o início da estação, ocorre hoje dia 20 de junho, às 23:42hm no horário de Brasília, em 2025. Na simbologia arquetípica, representa o mergulho no inconsciente, o momento em que a psique toca seu ponto mais escuro, como Jonas no ventre do grande peixe, como Cristo na tumba, como o herói que desce aos infernos para reencontrar sua centelha. É a travessia da sombra que antecede o ouro da manhã. Freud chamaria isso de retorno ao recalque; Jung, de confrontação com a Sombra. É o ponto da virada. Filosoficamente, o solstício é um lembrete do eterno retorno — ideia cara aos estóicos e a Nietzsche. Tudo declina para depois ascender. Morrer é...